A Rede LEQT – Leitura e Escrita de Qualidade para Todos – que reúne mais de 80 organizações da  sociedade civil que atuam no campo da promoção da leitura, da educação e da cultura, incluindo investidores e organizações sociais, produtores editoriais, bibliotecários, autores e representantes do setor público e da academia – vem a público manifestar sua posição contrária à taxação dos livros em 12% prevista na reforma tributária proposta pelo governo federal

O Projeto de Lei 3.887/2020, em análise na Câmara dos Deputados, propõe a criação da CBS (Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços) como substituição do PIS e Cofins. Equivocadamente, o texto retira a cadeia do livro como um dos setores beneficiados pela isenção fiscal.

A proposta reverte a Lei 10.265 de 2004, que é respaldada pelo inciso VI do artigo 150 da Constituição Federal, que proíbe a taxação de livros, jornais, periódicos e papel destinado à impressão.

A Rede LEQT considera que a medida afetará negativamente toda a cadeia produtiva do mercado editorial e colocará em risco o direito ao acesso ao livro, à leitura, à literatura e às bibliotecas, cujas políticas públicas já estão bastante fragilizadas, apesar de asseguradas pela lei 13.696/2018, da Política Nacional de Leitura e Escrita, ainda não implantada pelo Poder Executivo. Frente ao risco de retrocesso, a LEQT recomenda a ampla divulgação e assinatura da petição contra a proposta e subscreve o Manifesto em Defesa do Livro, elaborado por AbreLivros, CBL (Câmara Brasileira do Livro) e Snel (Sindicato Nacional dos Editores de Livro). Abaixo, o posicionamento de algumas instituições que integram a Rede.

Integrantes da Rede LEQT alertam sobre riscos da taxação dos livros

“A taxação dos livros vai na contramão de tudo o que a política pública deve garantir em um país já tão desigual e onde a batalha contra o analfabetismo funcional exige focalização extrema, que passa pela universalização e fortalecimento das bibliotecas em escolas, o que ficará ainda mais comprometido. Manutenção da desoneração do livro com responsabilidade e compromisso social é o que de fato precisamos” – Christine Fontelles, socióloga que idealizou e coordena a Campanha Quero Minha Biblioteca.

“A política de taxação poderá levar os gestores educacionais e escolares, na busca por assegurar maior quantidade de livros, a priorizar o critério do preço mais baixo, sacrificando a diversidade e/ou a qualidade, o que seria um retrocesso. Nossas escolas devem ter uma quantidade de livros ampla o suficiente para poder proporcionar variedade de leituras a seu público, inclusive aos familiares dos alunos, se o intuito é mesmo formar uma comunidade leitora. Isso requer acervo frequentemente reposto e atualizado. Se for aprovada, a medida reduzirá as possibilidades de mediação por professores e de aprendizagem pelos estudantes” – Comunidade Educativa CEDAC.

“A proposta é o retrato mais acabado da notória política destrutiva contra a cultura e a educação do atual governo. Não se trata de uma medida econômica, se trata de um ataque frontal ao direito à leitura, à democratização do acesso ao livro, assegurada pela Lei 13.696/2018, que institui a Política Nacional de Leitura e Escrita, e que o governo se recusa a cumprir” – José Castilho, consultor na JCastilho – Gestão&Projetos e ex-secretário executivo do Plano Nacional do Livro.

“Em suas 10 edições, o Inaf (Indicador de Alfabetismo Funcional) mostra a importância da leitura de livros. Em especial, chama a atenção o interesse pela leitura entre as pessoas alfabetizadas em nível elementar – equivalentes a 34% da população na faixa etária acompanhada pelo indicador e que ainda demonstram importantes limitações para compreender e interpretar textos. Para essas pessoas, ler é uma oportunidade de aprimorar as habilidades de letramento e ampliar suas oportunidades de desenvolvimento, pessoal ou profissional. Nesse grupo  56% têm renda familiar de até dois salários mínimos -, e o aumento do preço dos livros pode se constituir em uma barreira concreta para a continuidade desses avanços” – Ana Lima e Fernanda Cury, responsáveis pelo Inaf, que desde 2001 estima os níveis de alfabetismo da população entre 15 e 64 anos.

“É inoportuno discutir a questão do preço do livro de forma isolada, sem que o governo especifique como serão implementadas as políticas de leitura no país. Temos convicção de que a taxação será nociva. Hoje são raríssimos os municípios em que as bibliotecas públicas têm um orçamento próprio para manter e atualizar seus acervos. A proposta trará impactos negativos para a execução dos planos estaduais e municipais de leitura” – Pierre André Ruprecht, diretor executivo da SP Leituras – Associação Paulista de Bibliotecas e Leitura.

“Tão importante quanto nos mobilizarmos contra a proposta em curso é vincularmos essa pauta com a regulamentação do fundo idealizado como contrapartida da desoneração do preço do livro.  Somos pela não tributação e defendemos a imediata  regulamentação do Fundo Pró Leitura,  que contribuirá para  que as pessoas possam ter acesso ao  livro  e à leitura e de forma gratuita, por meio de uma rede  de Bibliotecas forte e atuante,  presente em todos os cantos do país”  – Adriana Cybele Ferrari, vice-presidente da FEBAB (Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários, Cientistas de Informação e Instituições).

“A leitura é um direito, não luxo. Taxar livros é reduzir ainda mais o seu acesso, é aumentar o fosso que queremos diminuir. É inviabilizar o acesso daquela camada que passou a comprar livros nos últimos tempos. Nosso movimento deve ser o oposto. O governo ainda sugere que livros possam ser doados à população de baixa renda, mas quem vai escolher esses livros? A leitura pode ser tutelada? Ler é também um gesto de liberdade, de encontro e de escolha” – Instituto Avisa Lá

“Trata-se de um golpe contra a democracia e a cultura. A proposta coloca em risco o esforço feito por bibliotecas comunitárias, que têm conseguido alterar as estatísticas de educação e de leitura nos territórios em que estão inseridas, como demonstra a pesquisa O Brasil que lê: Bibliotecas comunitárias e resistência cultural na formação de leitores. Livros mais caros podem impactar a realização de importantes festivais literários, como os que têm sido realizados nas periferias de diferentes cidades brasileiras, como a FELIZ (Zona Sul de SP), a FLUP (RJ), a FRICT e a de São Miguel Paulista (ambas na Zona Leste de SP). Essas literaturas têm nos proporcionado uma discussão crítica de mundo. É isso que a taxação dos livros procura atacar” – Bel Santos Mayer, coordenadora do Ibeac (Instituto Brasileiro de Estudos e Apoio Comunitário) e co-gestora da Rede LiteraSampa/RNBC (Rede Nacional de Bibliotecas Comunitárias)

“A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil (2019-2020), realizada pelo IPL (Instituto Pró-Livro), em parceria com o Itaú Cultural e aplicada pelo IBOPE Inteligência, indica que existem hoje cerca de 27 milhões de brasileiros nas classes C, D e E que são consumidores de livros. E a elevação de preços deve impactar tanto a indústria como o acesso ao livro e, em consequência, piorar os indicadores de leitura– que desde 2007, mantém um patamar em torno de 50% de leitores/não leitores. É um índice sofrível, confirmado em outras avaliações, inclusive internacionais, que apontam para a necessidade de políticas públicas mais efetivas para a superação desse déficit como condição para o desenvolvimento social e econômico no Brasil” – Instituto Pró-Livro

“Estimativas do SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros) indicam que a CBS encarecerá o livro em cerca de 20%, o que incidirá sobre toda a cadeia. Na nossa opinião os mais prejudicados serão os leitores de menor poder aquisitivo e as livrarias, pois os preços são estabelecidos pelas editoras. Além disso, avaliamos que os livros comprados pelos poderes públicos não estariam isentos da CBS, onerando ainda mais os programas de governo” – Matinas Suzuki Jr, diretor de operações do Grupo Companhia das Letras.

“A figura quixotesca do editor-cavaleiro em luta por um ideal tem sido a realidade das pequenas editoras, e isso com a atual isenção de impostos. A crise que já abalou frontalmente o mercado das editoras, redes de livrarias, pequenas livrarias e distribuidoras recebe agora o derradeiro ‘golpe do moinho’. Quem cai primeiro é o cavalo ou cavaleiro mais frágil, com efeito cascata sobre toda a cadeia. Todos serão impactados, da gráfica aos prestadores de serviços. Soma-se aos desmontes já realizados nas áreas educacionais e culturais pelo governo atual, agravados agora pela pandemia que paralisou a maioria dos setores da economia, essa proposta que se mostra também inconstitucional e abalará todas as conquistas relacionadas à democratização da leitura nos últimos anos. Onerar o livro não salva a economia, abate a cidadania” – Márcia Leite, da Editora Pulo do Gato.

“Há 19 anos promovemos a leitura e a educação de crianças e jovens da Amazônia, buscando superar a distância entre a região Sudeste, que concentra a produção e o número de leitores, e a região Norte do Brasil. Acreditamos que o fim da isenção aumentará o preço final do livro e colocará em risco o direito à leitura e à educação, aprofundando as desigualdades regionais já existentes” – Associação Vaga Lume

Fonte: GIFEREDE DE LEITURA E ESCRITA DE QUALIDADE PARA TODOS